terça-feira, maio 04, 2010

Lembranças de um ex-combatente barreirense


Nascido em Barreiras em 10 de junho de 1919, Eurypedes Lacerda Pamplona é filho de Manoel Messias Pamplona e Arlinda Lacerda Pamplona. Na infância o pai trabalhou como funcionário de uma empresa de Telégrafos para sustentar os sete filhos. Aos 19 anos, Euripedes se alistou e teve a oportunidade de viajar de avião para o Rio de Janeiro onde morou por quatro anos. Com a criação do dia do reservista teve de apresentar seus documentos que foram apreendidos, de modo que não pôde sair da cidade até ser convocado para servir à guerra. Esse dia não tardou muito. Após o Brasil entrar na guerra em agosto de 1942, dois dias apos ele foi convocado. Certa noite quando chegava do cinema à pensão onde morava encontrou seus amigos que lhe esperavam tristes para anunciar sua convocação à guerra. “Naquele momento me faltou as pernas, quase caí, mas não tive escolha, não podia sair da cidade porque meus documentos estavam presos”, disse Euripedes.
Os dois anos seguintes foram de intenso treinamento no 2º Regimento de Infantaria num campo utilizado por todas as forças armadas. Em meio ao treinamento pesado perdeu amigos e podia presumir que estava cada vez mais próxima uma realidade muito mais difícil e dias piores.
Em 1944 partiu para Itália a bordo do navio Meighs. Apesar de boas instalações, os enjôos eram inevitáveis. Depois de quinze longos dias desembarcaram em Nápoles. Os soldados se alojaram em uma espécie de depósito distante do Front onde eram identificados e organizados em companhias de 200 homens cada, sempre em exercício esperando chegar o grande momento. No Front os soldados estavam em combate todo o tempo. Quando morriam, mais soldados eram requisitados de cada companhia. Ao chegar sua hora, Euripedes foi com fé e confiança. Por fazer parte da Divisão de Infantaria sua posição no Front era de ataque. Como metralhador contava com o auxílio de dois soldados municiadores.
Foram dez meses em combate. Além do perigo dos ataques, os soldados também tinham o frio como companhia. Alguns adoeciam e eram hospitalizados. “A neve chegava a quase um metro. As atividades eram interrompidas e iniciava-se o cessar fogo no Front. Somente os carros patrulha estavam em atividade e se cruzassem com o inimigo não restava ninguém vivo”, relembra Euripedes. A tropa não tinha folga, apenas revezavam quando o capitão determinasse quem iria para a reta-guarda, assim os soldados tomavam banho, após oito dias mais ou menos. A miséria e o estado de calamidade vivenciada pelos italianos nesse período sensibilizavam os soldados que se solidarizavam distribuindo um pouco de seus alimentos a quem passava fome. O Natal deste ano para Euripedes, certamente foi o mais triste de sua vida. Sozinho em um hospital de campanha em Livorno, abalado por uma bomba que caiu em um local próximo.
Quando os brasileiros não mais tinham esperança, a invasão do Monte Castelo foi um dos episódios que ficaram marcados para sempre na memória do ex-combatente. “Havia uma ponte de acesso que era destruída durante o dia pelo inimigo e reconstruída por nós à noite. Foi uma tomada muito difícil e muita gente morreu. Depois de três tentativas fracassadas a conquista foi um sonho para nós”, afirmou Pamplona.
Em meio ao caos, mais de dois mil soldados brasileiros e cerca de 65 milhões de pessoas ao todo morreram durante a guerra. As imagens estão presentes nos pesadelos do ex-combatente até hoje.
O fim da guerra em 30 de abril de 1945 foi a notícia mais esperada pelos soldados que festejaram com alegria e muita vontade de retornar à Pátria. Esse retorno não aconteceu de imediato por causa da logística. Durante os três meses na Itália após a guerra, Euripedes teve a oportunidade de conhecer muitos lugares e dançar a tarantela.
O regresso foi organizado a cada cinco mil homens. O primeiro escalão chegou ao Brasil em 17 de setembro de 1945 recebido calorosamente pela população carioca na Baía de Guanabara. Foram homenageados e receberam medalhas de campanha. No Rio Euripedes permaneceu por mais seis anos e já se considerava um carioca. Mas ainda assim sentia muita falta da família e retornou à sua cidade natal. Em Barreiras foi acolhido com muita festa e homenagens. Ao longo do tempo foi convidado para participar de eventos como desfiles cívicos e cerimônias no 4º Batalhão de Engenharia e Construção - BEC, além de entrevista à emissora de TV local e palestra em escolas da cidade. Em seus relatos, Eurypedes Pamplona diz não sentir orgulho de ter participado da guerra, mas por amar o exército conserva a ideia de que servi-lo é uma das melhores oportunidades para disciplinar uma pessoa.

Texto de Ana Lúcia Souza e Grupo Personagens em abril de 2008 durante produção da Grande Reportagem da disciplina de Redação Jornalística III da professora Nádia Borges - Faculdade São Francisco de Barreiras – FASB
Foto: Arquivo pessoal de Eurípedes Pamplona

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