quarta-feira, abril 07, 2010

Da loucura ao jornalismo


Por Ana Lúcia Souza
Publicado em 07.04.10 às 17h20

Dizem que sou alegre, elétrica, complicada, já até me chamaram de ‘psicologicamente desequilibrada’, e que ainda me desespero com o primeiro problema que encontro, muito embora procuro levar a vida de uma maneira louca porque penso que certinho todo mundo é ou finge, e o que é comum um dia se torna um tédio.

Me permito estranhar, admirar com facilidade, principalmente com as coincidências que volta e meia cruzam meu caminho. Manias. Várias. Mania de detalhes, planejamentos exacerbados, até mesmo do improvável e de pensar demais. Tudo previamente calculado. As justificativas sempre estão à porta. Alguns amigos comentam que falo muito e rápido demais. Falo para quem não quer ouvir, sozinha, com o ar ou até mesmo quando insisto em brigar com móveis e objetos nos momentos de muita raiva.

Acho que costumo atrair muito o negativo. Certa vez perdi uma oportunidade de trabalho por não saber ao certo descrever duas de minhas qualidades. Em compensação, na ponta da língua já estavam dois de meus principais defeitos: pessimismo e preocupação excessiva. Aliás, os excessos sempre me perturbaram muito desde a infância e me causaram muitos arrependimentos. Ah se pudesse voltar no tempo e principalmente ter a oportunidade de fazer o que não fiz. Até hoje guardo vestígios dessa herança traumática.

Se ainda fosse criança, queria fazer tudo como qualquer uma criança de verdade faz. Pensar como criança, agir como criança e não me deixar ser tão reprimida. Fazer muito barulho mesmo, sujar o uniforme ao brincar no recreio da escola, mascar chiclete, brincar também com outras crianças que não fossem somente minhas primas, banhar escondida na barragem, soltar traque no São João ao invés de patéticas bombinhas de salão e não anunciar em público aos 10 anos, em plena inauguração da quadra poliesportiva, que queria ser freira para que isso não tivesse reflexos negativos na adolescência, mais precisamente aos 13 anos em 2000. Ano que prefiro não lembrar. Na verdade, preferia poder dizer hoje. Nossa! Como poderia ter vivido mais intensamente e curtido a vida adoidada!

Uma vez, uma psicóloga me deu conselhos para ser mais objetiva, tentar me controlar e controlar também meus pensamentos, e aí eu comprei um saco de boxe para tentar libertar um pouco as tensões e toda energia contida. Muito persistente e insistente, para não dizer cara de pau mesmo.

Prova disso foi a profissão que escolhi. Não foi fácil tentar convencer meus pais de que era o jornalismo que eu realmente queria para mim. Mas fui assim mesmo. (Antes tivesse ouvido eles!). Bem. Continuando...ran, ran. Mas não me arrependo. Acredito que as pessoas devem escolher o que gostam de fazer e se sentir bem por si mesma e não pelo que os outros acham.

Outro dia mesmo chegava à faculdade no primeiro dia de aula com medo de tudo e todos. Fazia mil perguntas a mim e já pensava como aquilo tudo iria acabar para ver logo os resultados. A princípio presumi que a experiência se tratava simplesmente de agregar novos conhecimentos, sem que interferisse no meu paradigma excessivamente responsável de ser. Foi um impacto e tanto!Percebi que o meu paradigma estava assim, meio que digamos, ultrapassado. E que isso me impedia de viver mais intensamente. Aprendi a ouvir mais e em contrapartida, deixar a vida fluir mais impulsiva e natural.

Ouvi comentários de que havia me transformado da água pro vinho e em montila também. Embebida nesse misto de conhecimentos, as experiências me proporcionaram surpresas maravilhosas que passaram a interferir diretamente em meu organismo que começou a reagir de forma totalmente contrária às habituais. Em momentos de dificuldade, quando a solução parecia não mais chegar, a loucura do conhecimento invadia minha cabeça e norteava possibilidades de respostas. Mesmo sem querer por vezes o controle fugia as minhas mãos e estas certamente ficaram registradas em minha personalidade por produzirem balanços frenéticos em momentos de forte tensão. Sem querer também passei a imitar pessoas que passaram a cruzar meu caminho, mais que ficaram marcadas pelos gestos, ações e lições de vida. Construí laços de amizade que certamente irei levar para o resto da vida. E até participei da fundação de um clube em sala de aula: o Clube do Choro.

A experiência acadêmica me fez descobrir que para me tornar uma grande jornalista era preciso muito mais do que ler, escrever ou falar muito como sempre faço. É preciso ir além do comum, desconstruir ideias e principalmente matar a curiosidade do que ainda não vivi até agora. Viver intensamente tudo, sem limites. ‘Viver até doer’. Agora, é só o começo e mais do que nunca tenho a certeza de que me encontrei no jornalismo por ser a oportunidade para experimentar grandes emoções e fazer descobertas sem medo. A melhor sensação é depois poder partilhar essas experiências em forma de um produto final: a notícia.

Por esses e tantos outros motivos, hoje, sete de abril, dia dedicado aos profissionais de jornalismo não poderia ter escolhido melhor momento para dar início ao meu blog Analítica, uma sugestão do caríssimo professor Carlos Araújo. Apesar da indisponibilidade deste nome para o endereço não pude descartar também a votação sincera em Ana de ideias dos nobres colegas e amigos jornalistas agora com diploma! Dias melhores para nossa classe!!!

Dica de Leitura: Amar, verbo intransitivo (Mário de Andrade)

  “As conveniências muitas vezes prolongam a infelicidade”. Em ‘Amar, verbo intransitivo’, embarcamos com Mário de Andrade, em uma obra cara...