segunda-feira, novembro 09, 2020

Leituras de novembro: 'Minha vida de rata' e 'O dia em que a poesia derrotou um ditador'


"Uma verdade dolorosa sobre a vida familiar: as emoções mais tenras podem mudar em um instante. Você acha que seus pais amam você, mas será que amam você ou a criança que é deles?", página 21.

'Minha vida de rata', ficção americana de autoria da escritora Joyce Carol Oates, é a obra indicada pela Tag Livros Experiências Literárias no mês de outubro. Nessa leitura pude conhecer a história de Violet Rue, a caçula da família Kerrigan. A narrativa começa em novembro de 1991, quando Violet tem 12 anos e sete meses. "A família é um destino especial. A família em que você nasce e da qual não há escapatória", página 16.

As lembranças da infância e do relacionamento com os pais e os irmãos e da casa onde moravam até o final de sua infância, são frescas na memória de Violet. "Nós morávamos em uma casa de dois andares com estrutura de madeira no número 388 da rua Black Rock, em South Niagara", página 28. 

Estupro de Lisa Denver, uma garota com deficiência mental, ao qual os irmãos Jerome e Lionel Kerrigan estavam envolvidos é algo marcante na narrativa. Testemunhar os depoimentos dos irmãos na cozinha de sua casa, sobre o espancamento do garoto afrodescendente Hadrian Johnson,  (17), estudante de ensino médio e jogador do time de basquete da escola que viria a morrer dias depois, e o depoimento de Violet à enfermeira da escola é o fato norteador para a expulsão de sua própria casa aos 12 anos.  

"Rata vadia. Rata piranha. Dedo-duro. Vamos arrancar a porra da sua cabeça", página 116. "Violet como você pôde? Acabou com as nossas vidas. Seu pai nem consegue falar sobre isso. Não consegue falar sobre você. Enquanto conseguir ficar aqui melhor. Não tem lugar para você em casa", página 117. Primeiro ela mora em um abrigo, depois na casa da tia. "Meu coração está partido. Tolo, sentimental. Não morava com minha família, mas com parentes. Muito melhor do que num abrigo ou num centro de detenção para fugitivos", página 195.

Jerome e Lionel cumpriram pena na Unidade Prisional do Centro do Estado em Marcy, Nova York. "Estou indo atrás de você, rata. Rata, puta. Não vai conseguir se esconder", página 198.

Estudante universitária, trabalha como garçonete meio período e também faxineira. "Se a minha vida de rata acabar um dia, lembrarei daqueles anos da mesma maneira que se olha para um sonho febril, onde o protagonista do sonho está em estado contínuo de perseguição, desespero. Cumprindo minha pena. Sem condicional", página 259. 

Talvez o que Violet não imaginasse é que sendo rejeitada pela própria família por denunciar uma verdade que mudaria a reputação dos Kerrigan, viesse a passar por maus bocados. Longe do seio familiar, ela sofre assédio sexual e sente que sua vida é um grande risco. "Só estou correndo para salvar minha vida", página 314.

Após a morte do irmão mais velho Jerome Jr. na cadeia e do pai, e ter passado grandes dificuldades para se manter, o reencontro com Tyrell Jones, um conhecido do tempo de colegial surge como uma esperança. Com a saída do irmão mais novo após cumprir a pena ela, apesar de achar que ele irá atras dela para se vingar, mesmo assim, ingenuamente, correndo riscos, ela quer retornar a sua cidade natal e reencontrar a família

"No último vislumbre que eu tivera da mamãe ela estava se afastando de mim, no 'abrigo'. Drogada e de andar trôpego mas determinada a escapar de mim. Difícil evitar reconhecer o fato de que a minha mãe havia me abandonado. Transformou-me numa órfã. Por quê?", página 341.

Com todos os perigos que configura o reencontro com a família, já esperando a vingança de Lionel, mais uma vez ela consegue fugir. E mesmo que isso significa viver longe de sua família, ela, com 27 anos, escolhe sua liberdade, e entende que apesar da escolha feita e da perda que isso representa, a partir de agora ela poderá enfim ser feliz.  "Está feliz em entender que uma nuvem idêntica nunca virá de novo, não importa quão bela, quão única. Você chora pela sua perda", página 344.

Encontro das Taggers


Após oito meses realizando discussões literárias por meio da plataforma online, foi realizado na tarde de 25 de novembro um encontro para confraternização das participantes da Tag Curadoria Barreiras. 


O momento foi de descontração, discussão prévia sobre o livro Minha vida de rata, e também contou com a realização do amigo oculto de livros. 



Na oportunidade presenteei as taggers com exemplares de 'Um rio de histórias', o qual divido autoria com as colegas Jackeline Bispo e Luciana Roque.


O dia em que a poesia derrotou um ditador (Antonio Skármeta)



A segunda leitura realizada neste mês, trata-se do livro selecionado para novembro da Tag Livros Experiências Literárias. De autoria de Antonio Skármeta, 'O dia em que a poesia derrotou um ditador', é uma obra de ficção chilena que narra a história da prisão de um professor de filosofia em Santiago no final da década de 1980, quando o país vivia um período de ditadura e as prisões eram bem comuns. 

O então ditador Augusto Pinochet anuncia um plebiscito em que a população deve votar contra ou a favor da continuidade de seu governo. Esse enredo irá envolver a narrativa de Nico, filho do professor Paredes e os desafios da campanha do 'Não', realizada pelo renomado publicitário Adrián Bettini, que com muita ousadia, poesia e alegria irá dar vida a reconstruir uma nova página política. "Há maneiras e maneiras de calar. Há maneiras de dizer calando. Ás vezes a única maneira de dizer é calar o que todos entendemos que deveria ter dito".

A escrita de Antonio Skármeta é bem simples, os capítulos são curtos e eu adorei a obra. A leitura foi bem tranquila e agradável e que apesar das várias facetas de um sistema político opressor, mostrou que com criatividade e carisma de uma ideia bem construída que configurou uma campanha bem feita que pôde alcançar a aprovação da maioria e vencer um plebiscito revertendo a história política de um país. 

"Agora é a vez de vocês. O importante é que, se ganharem o governo, vocês façam algo para acabar com esta coisa tão antipática de estigmatizar as pessoas, entre as que votaram "Sim" e as que votaram "Não". É preciso ser moderno e se sentar em cima das diferenças".


Texto e fotos: Analítica

Dica de Leitura: Amar, verbo intransitivo (Mário de Andrade)

  “As conveniências muitas vezes prolongam a infelicidade”. Em ‘Amar, verbo intransitivo’, embarcamos com Mário de Andrade, em uma obra cara...