sexta-feira, abril 30, 2021

Nêmesis (Philip Roth)




"A epidemia da pólio de 1916 no nordeste dos Estados Unidos, quando ocorreram mais de 27 mil casos e 6 mil mortes. Em Newark, haviam sido observados 1360 casos e 363 mortes"(...) "Uma doença capaz de causar paralisia, deixando uma criança aleijada para sempre ou incapaz de respirar fora de um cilindro de metal conhecido como pulmão de aço - isso quando a paralisia dos músculos não leva à morte", página 12.

De Philip Roth, Nêmesis traz um enredo que em muito se parece com o atual momento de pandemia. O Analítica embarcou em uma viagem a uma comunidade judaica nos Estados Unidos no ano de 1944, onde uma epidemia de poliomielite assola  a cidade de Newark. Sem saber os reais motivos causadores do surto da pólio, toda a população fica aterrorizada. 

O protagonista, Bucky Cantor é órfão de mãe e cresceu com os avós maternos. Míope, usava óculos de lentes grossas, e por isso, um dos poucos jovens que não foi lutar na guerra como seus amigos. Aos 23 anos, seu físico é invejável a qualquer garoto de sua idade. Recém formado, ele é professor de educação física e fiscal de pátio da escola Newark Equatorial, na avenida Chancellor, local frequentado por algumas das primeiras crianças infectadas pela pólio. 

Enquanto crianças são contaminadas, ficam paralíticas, incapazes de respirar fora de um 'pulmão de aço', ou morrem, a cidade fica a cada dia em alvoroço com o aumento dos casos e também pela falta de suprimentos hospitalares. Algumas pessoas até cogitam possibilidades de ser contaminados pela doença: as fortes temperaturas as quais as crianças estão expostas nas aulas de educação física e que por isso a escola deveria entrar em quarentena, outros apontavam a circulação das notas de dinheiro, do cachorro quente vendido ou dos gatos expostos nas ruas, e até mesmo das entregas de correio. Pressionado pelos pais dos alunos, Bucky assume uma postura de tranquilidade em que afirma que o importante é manter a limpeza e não entrar em pânico, principalmente com as crianças.

Bucky sente-se responsável pelas crianças contaminadas e impactado com a morte delas, pois trata-se de pessoas próximas a ele. Essa relação de proximidade entre ele e as famílias das vítimas é propícia para um sentimento de culpa. Ele culpa a si mesmo como o principal vetor da doença na escola e culpa a Deus por deixar as crianças morrerem. 

Para fugir do caos em Newark, ele atende ao pedido da noiva Márcia, e muda-se para a colônia de férias em Indian Hill - segunda parte do livro. Tudo vai muito bem até que nesse acampamento onde ele é instrutor de esportes aquáticos surgem os primeiros casos de contaminação de pessoas com quem ele teve contato.   
 
"Houve 30 novos casos de pólio em Wequahic. 79 na cidade só ontem. 19 mortos. Todos esses números são recordes. E houve mais casos no pátio da Chancellor" (...) "As pessoas estão em guerra. Todo mundo apavorado. Todo mundo assustado por causa dos filhos. Graças a Deus você foi embora. Os motoristas dos ônibus das linhas 8 e 14 dizem que só vão entrar em Weequahic se tiverem máscaras de proteção", páginas 136 e 137.

Um dos momentos mais interessantes que a narrativa reserva - na terceira parte do livro - é a revelação do narrador e seu encontro com Bucky anos depois. Ele narra com detalhes as sequelas da infecção da pólio no Cantor, e principalmente do sentimento de culpa da sobrevivência que Bucky carrega ao longo dos anos por acreditar ser a principal causa da contaminação. "Fui o vetor da poliomielite no pátio. Fui o vetor da poliomielite em Indian Hill", página 176. 

O título 'Nêmesis', que na mitologia grega significa Deusa da Vingança/Justiça, talvez fora utilizado propositalmente pelo autor para justificar o triste fim escolhido pelo próprio protagonista. Não é revelado no enredo o vetor de contaminação da epidemia mas achei interessante que o narrador finaliza deixando uma provocação acerca de Bucky, se ele teria ou não alguma parcela de culpa. "Talvez suas afirmações não fossem exageradas e ele não houvesse chegado à conclusão errada. Quem sabe ele não fosse mesmo a flecha invisível?", página 194.

Última obra publicada de Philip Roth, 'Nêmesis', é uma ficção norte-americana e indicação de abril da Tag Livros. É o primeiro contato do Analítica com o autor. O projeto gráfico contempla fotografias históricas que casam com o enredo e exaltam ilustrações em tons amarelo e lilás referentes às altas temperaturas do período em que a história acontece. É um livro denso, a história é triste, mas em meio ao caos, incertezas, medo, revolta, ódio, busca por respostas, principalmente porque não tem como não estabelecer certas comparações com o contexto atual da pandemia do Coronavírus, proporciona muitas reflexões que fazem a leitura valer muito a pena


Para essa foto foram usados, além do livro, o mimo que acompanha a caixinha do mês o copo de buteco com a escrita 'O barista' em alusão a obra 'O alienista' de Machado de Assis, um sousplat de crochê produzido pelo Crochê da Kau @amorimkauane20 e a cerveja artesanal produzida pela empresa Matt Bier de Mucugê, Bahia.

Por Analítica 

segunda-feira, abril 26, 2021

Frida Kahlo e as cores da vida (Caroline Bernard)


"Estou apenas tentando deixar o mundo ao meu redor um pouco mais bonito. Além disso, consigo me esquecer das minhas dores enquanto pinto", p.42.

Admiradora da história de Frida kahlo, por curiosidade, adquiri 'Frida Kahlo e as cores da vida' de Caroline Bernard, indicação do mês de janeiro da Tag Livros mesmo não sendo assinante da modalidade Inéditos.

A obra é dividida em três partes, considerada uma narrativa ficcional em que a autora se inspirou em biografias sobre a consagrada artista mexicana, e construiu sua própria história, que resultou em um romance biográfico que apresenta aspectos icônicos da vida de Magdalena Carmen Frida Kahlo y Calderón, com destaque para os conflitos, problemas de saúde, a relação com a família, com a arte e cultura mexicana, além do conturbado matrimônio com o pintor Diego Rivera. 

É impossível ler sem imaginar por traz um cenário que expressa um contexto de flores, cores, arte, revolução, força, feminismo e vida, que faz jus ao título do livro, mas que também se contrasta por outro lado, com sofrimento, humilhação, traição de uma personagem que muitas vezes, se apresenta indecisa e frágil. 

Um dos marcos da narrativa e da vida de Frida é o acidente sofrido por ela na juventude, algo que irá mudar sua vida para sempre. Também no decorrer da sua trajetória, e que o livro enfatiza muito bem, que apesar dos problemas de saúde que enfrenta e as diversas cirurgias que submete, a história mostra como ela encontra na pintura a válvula de escape para superar seu sofrimento e sagrar-se como uma grande artista mexicana, que soube transformar sua dor e sua cultura em arte e expressão de liberdade. Li e recomendo!

"Então eu vivo na minha pintura [...]. A vida é bela demais, colorida demais para ser apenas suportada. Quero apreciá-la, quero sentir alegria e amor", p. 47.


Como plano de fundo da Foto 1, foi utilizada uma das janelas do Museu Municipal Olavo Pereira dos Santos em São Desidério, em cor azul, a qual pensei em usar fazendo referência à Casa Azul de Frida Kahlo em Coyoacán, México. E na Foto 2, como fundo, um bouganville rosa que enfeita a orla da Barragem, também em São Desidério, por ser uma planta citada para descrever alguns momentos a narrativa acerca do quintal da Casa Azul de Frida.

Por Analítica


O Ateneu (Raul Pompéia)

 


"Vais encontrar o mundo, disse - me meu pai, à porta do Ateneu. Coragem para a luta", página 03. Entre  as principais recordações, frustrações, amizades, intrigas, aventuras, relacionamentos conturbados e as tentativas de adaptação no colégio interno, Sérgio, personagem principal deste enredo, vai narrando a experiência de dois anos que viveu dentro dos muros do Ateneu.

Para diversificar as leituras, em abril o Analítica optou também por este clássico da Literatura Brasileira, obra escrita em 1888 e dividida em 12 capítulos. Do consagrado escritor Raul Pompéia, a história é baseada na própria experiência do autor, enquanto interno no Colégio Abílio no Rio de Janeiro.

Alguns marcos da narrativa se referem a alguns relatos sobre as dificuldades do relacionamento do personagem central Sergio com o diretor Aristarco Rebelo, com críticas às diversas situações de crises, miséria moral, hipocrisia marcadas pelo sistema educacional da época. 

"Onde meter a máquina dos ideais naquele mundo de brutalidade que me intimidava com os obscuros detalhes e as perspectivas informes escapando à investigação da inexperiência? Qual o meu destino, naquela sociedade que o Rebelo descrevera horrorizado, com meias frases de mistério, suscitando temores indefinidos, recomendando energia como se coleguismo fosse hostilidade?", página 22.

A indicação dessa leitura surgiu de uma discussão em um encontro da Tag Curadoria Barreiras sobre o livro 'Moisés Negro', de Alain Mabanckou, que também trata sobre a rotina de garotos internos em um orfanato. A semelhança dos enredos entre os dois livros chamou a atenção e por também já ter ouvido falar sobre 'O Ateneu', achei pertinente a leitura para o momento. É uma ótima indicação para quem adora ler sobre memórias com um final interessante e repleto de nostalgia. A partir de agora o Analítica irá inserir com mais frequência obras da Literatura Brasileira em suas leituras. 

"Aqui suspendo a crônica das saudades. Saudades verdadeiramente? Puras recordações, saudades, talvez, se ponderarmos que o tempo é a ocasião passageira dos fatos, mas, sobretudo - o funeral para sempre das horas", página 120.

Por Analítica

sexta-feira, abril 23, 2021

Dia Mundial do Livro


No momento, estou lendo simultaneamente estes dois livros. 'O Ateneu' de Raul Pompeia e 'Frida Kahlo as cores da vida' de Caroline Bernard. Ambos tratam de temáticas totalmente diferente, mas escolhi assim para tentar conciliar a leitura de uma obra da literatura brasileira e outra da literatura internacional. Até o momento tem fluido bem a leitura!



Por Analítica

 

quarta-feira, abril 07, 2021

Analítica faz 11 anos



A data, 7 de abril, dia do jornalista, foi proposital para a estreia do Analítica, há 11 anos. Um espaço virtual para compartilhar reportagens e aventuras da rotina de uma jornalista recém formada e um pouco 'maluquinha'. 

O projeto tinha muitas perspectivas que foram se perdendo pelo caminho  com o desânimo da profissão e algumas tentativas frustradasCom o tempo, em meio ao imediatismo das redes sociais, mas no intuito de se reinventar e não perder sua essência e nem o respeito de seu público, o blog passou a adotar uma tendência mais voltada à literatura, com produção de conteúdos literários, a exemplo de dicas de livros, fotos, notas sobre eventos culturais e referentes à leituras realizadas. 

E é por isso que hoje, este blog não poderia deixar de agradecer aos seguidores, leitores e colaboradores que fazem parte desses 11 anos de história. Fica também o convite para que continuem acompanhando a trajetória do Analítica. 

Por Analítica

Dica de Leitura: Amar, verbo intransitivo (Mário de Andrade)

  “As conveniências muitas vezes prolongam a infelicidade”. Em ‘Amar, verbo intransitivo’, embarcamos com Mário de Andrade, em uma obra cara...