terça-feira, setembro 29, 2020

A síndrome de Aquiles - Como lidar com as crises de imagem (Mário Rosa)

 


"Várias organizações e líderes costumam manter uma fé cega em si mesmos, menosprezando muitas vezes essa percepção externa da imagem. Mais uma vez vale lembrar aquele velho ditado da comunicação: a comunicação não é o que você diz, mas o que os outros entendem. Ou, de outra forma: a sua imagem não é a que você vê, mas a que os outros vêem. Ou ainda: os seus valores não são só os que você cultiva, mas os que os outros associam a você", página 90.

Fugindo um pouco das leituras convencionais mensais, resolvi optar por esta obra para a segunda leitura do mês de setembro. Na verdade uma releitura. O livro faz parte do meu acervo desde a época da faculdade e estava empoeirado na minha estante faz um bom tempo. 

Para entender um pouco sobre a obra é preciso recorrer à história, mais precisamente a narrativa da mitologia grega. Como o autor se refere nos primeiros capítulos, para a mitologia grega, Aquiles era 'sinônimo de invencibilidade'. Ainda criança, ele foi mergulhado pela mãe, a semideusa Tétis no Rio Estige e esse mergulho o tornaria um ser invulnerável. Mas como a mãe tinha que segurar a criança por alguma parte do corpo, segurou-o pelo calcanhar, mergulhando-o de cabeça para baixo, tornando esse o seu único ponto fraco: o calcanhar.

"Derrotava os inimigos como se eles não existissem, avançava e ocupava espaços como nunca se vira. (...) Um dia em que a guerra estava bastante acirrada em Tróia, Aquiles seguia para os portões da cidade, quando parou para zombar de dois pobres e infelizes troianos que estavam em seu caminho.  Aquiles gabava-se de seus grandes feitos, das cidades que havia aniquilado, dos tesouros que acumulava e do quão temível se tornara. Nesse momento uma lança reluzente foi atirada em sua direção, acertando-lhe o único ponto vulnerável de seu corpo: como se sabe, o calcanhar. A morte foi rápida. O destruidor de tantas cidades caiu estendido no chão. Não se sabe ao certo quem foi o autor do assassinato", página 37.

O autor faz comparativos do personagem da mitologia grega Aquiles com as crises de imagem enfrentadas por empresas e personalidades públicas revelando apontamentos a serem seguidos em gerenciamento de crises desenvolvidos ou não por equipes de Assessoria de imprensa. Para entender o que é uma crise de imagem, o autor define parafraseando Ian Mitroff, um dos precursores da administração de crises do mundo, o qual define que a crise de imagem difere das demais, 'quando ela tem origem humana, o que torna o caso potencialmente muito mais chamativo e perigoso', página 21. 

Para o estudioso, "em contraste com os desastres naturais, sobre os quais frequentemente temos pouco controle, falhas humanas provocam crise em função de ações ou de inações impróprias" e ainda: "Em princípio, falhas humanas podem ser previstas e, exatamente por esse motivo, o público se sente escandalizado quando elas ocorrem", página 21.

Mario Rosa também destaca em um certo capítulo abordagens acerca de 'Quando a crise é você', para aproximar o leitor do assunto em questão, declarando que é preciso que "você está sendo visto por pessoas estranhas, que não o conhecem como realmente é" e que "nos contatos com a mídia, na definição de sua estratégia, lembre-se sempre de que você será visto como o símbolo de algo". 

O autor traz modelos de Gerenciamento e de Administração de Crises e aponta também pilares que sustentam a imagem, a exemplo de: valores, novos valores e significados, e chama a atenção para que seja observado se a imagem é consistente, coerente, estável, e se tem capacidade para sobreviver e de organização. 

A narrativa de Mário Rosa apresenta nessa obra é sempre fundamentada por exemplos de empresas ou personalidades públicas que passaram por crises de imagens e na maioria das vezes, o que fizeram para contornar a situação, saindo vitoriosas ou não. Na época, adquiri o livro para estudos da disciplina de Assessoria de Comunicação, área em que atuo, e hoje caracterizo como uma leitura bem oportuna para o momento, além de rever alguns conceitos e apontamentos do autor que podem ser agregados ao dia a dia.

Por Analítica

terça-feira, setembro 22, 2020

O menino do pijama listrado (John Boyne e Oliver Jeffers)



"Há centenas de crianças aqui", disse Bruno, sem pensar realmente nas palavras antes de dizê-las. "Só que elas ficam do outro lao da cerca". (...) "Eu as vejo da janela do meu quarto", disse afinal. "estão muito longe, é claro, mas parecem centenas. Todas vestindo os mesmos pijamas listrados", página 274.

Infância, inocência, amizade, curiosidade, cumplicidade, descobertas. Essas são apenas algumas características que marcam a história de Bruno e Shmuel.  Dois meninos da mesma idade separados por realidades diferentes. "Quero saber daquelas pessoas que eu vejo da minha janela. As que moram nas cabanas, lá longe. Estão todas com as mesmas roupas". "Ah, aquelas pessoas", disse o pai, acenando com a cabeça e sorrindo levemente. "Aquelas pessoas...bem, na verdade elas não são pessoas, Bruno", página 90.

Agora depois de ter concluído a leitura, me questiono como pude ter deixado esse livro há tanto tempo na minha lista de espera. Algum tempo já tinha ouvido falar da obra e resolvi adquirir para meu acervo pessoal. "Quando eu era criança", disse Bruno para si mesmo, "costumava gostar de explorar. E isso ainda em Berlim, onde eu conhecia todos os lugares e sabia encontrar o que quisesse, mesmo vendado. Nunca explorei este lugar, talvez seja hora de começar", página 149.

Uma narrativa comovente, emocionante e mostra o quanto podemos aprender a partir da ingenuidade de duas crianças. "O garoto era menor do que Bruno e estava sentado no chão com uma expressão de desamparo. Ele vestia o mesmo pijama listrado que todas as outras pessoas daquele lado da cerca, e um boné listrado de pano. Não tinha sapatos ou meias, e os pés estavam um pouco sujos. Usava uma braçadeira com uma estrela desenhada. Quando Bruno se aproximou do menino pela primeira vez, ele estava sentado no chão de pernas cruzadas, olhando para a poeira debaixo de si. (...) Bruno teve a certeza de jamais ter visto um menino tão triste e tão magro em toda a sua vida, mas decidiu que seria melhor conversar com ele", páginas 162 e 163.

A partir do momento em que Bruno, o garoto alemão muda-se com sua família da casa em Berlim para uma casa isolada no campo, vê sua rotina mudar por conta da promoção de trabalho de seu pai. "Na verdade, para onde quer que ele olhasse, só via dois tipos de gente: se não eram os soldados felizes, sorridentes e gritalhões nos seus uniformes, então eram as pessoas infelizes e choronas de pijama listrado, a maioria das quais parecia estar olhando para o nada, como se estivessem de fato adormecidas", página 300.

Sem a presença dos antigos amigos, agora ele precisa de alguém para brincar. Pela janela do quarto da nova casa, ele vê ao longe algo que parece ser uma fazenda e pessoas que vestem pijama. Sua curiosidade o instiga a aproximar de forma escondida desse local. É quando conhece, do outro lado da cerca o garoto judeu, Shmuel. O mais incrível é a primeira percepção que Bruno tem em achar que se estivesse do outro lado da cerca, como Shmuel, ele teria mais amigos para brincar. 

"É tão injusto", disse Bruno. "Não entendo por que tenho que ficar encalhado do lado de cá da cerca, onde não há ninguém pra conversar nem para brincar, e você fica com dúzias de amigos e provavelmente brinca durante horas e horas todo o dia. Terei que conversar com meu pai a respeito disso", páginas 168 e 169.  

Nem mesmo a cerca é empecilho para uma grande e verdadeira amizade. São nesses encontros que eles brincam, riem, conversam e fazem planos de um dia estarem juntos em um mesmo lado. "Ele olhou para baixo e fez algo bastante incomum para a sua personalidade: tomou a pequena mão de Shmuel e apertou-a com força entre as suas. 'Você é meu melhor amigo, Shmuel', disse ele. 'Meu melhor amigo para a vida toda", página 310.

Em um desses planos que tentam realizar, ingenuamente motivados pela vontade de se ajudarem e de finalmente estarem próximos um do outro, a história de amizade entre os dois culmina em um final trágico e emocionante. "O soldado deixou tudo lá, intocado e foi buscar o comandante, que examinou a área e olhou para a esquerda e para a direita assim como Bruno fizera, sem ser capaz de compreender o que acontecera com o filho. Era como se ele tivesse simplesmente desaparecido da face da terra e largado as roupas para trás", página 311.

Embora sem final feliz, a narrativa consegue prender o leitor aos detalhes do enredo e o livro é uma ótima sugestão de leitura. Ao longo da história por vezes consegui imaginar o ambiente do campo de concentração, a voz dos meninos e me comover com tamanha inocência e ingenuidade dos dois garotos em meio a tanta maldade e tudo o mais que se possa imaginar de cruel numa história que se passa na época marcada pelos abusos do Nazismo.

Por Analítica 


Dica de Leitura: Amar, verbo intransitivo (Mário de Andrade)

  “As conveniências muitas vezes prolongam a infelicidade”. Em ‘Amar, verbo intransitivo’, embarcamos com Mário de Andrade, em uma obra cara...