Era um dia atípico. A vizinhança percebia de longe a fumaça do forno a lenha aceso bem cedo e todo o movimento na casa da vó Si, quando era dia de fazer biscoitos. Primeiro, era preparada a massa da pêta, a base de tapioca com óleo, sal e água (escalda) e muitos ovos. Lembro do barulho da vó batendo a massa com a mão, levantando-a e retornando ao grande tacho de alumínio em cima da paredinha da copa. Depois que a massa chegava ao ponto, passava certa quantidade de óleo para celar.
Forno quente, bandejas untadas com óleo, a massa saía do tacho em pequenas porções num saco feito de tecido jeans com um furo na ponta. Aos poucos, a massa era pingada nas bandejas e ganhava formato de bolas e 'dedinhos'. A vó era bem rápida para preencher as bandejas, que iam ao forno, e eram retiradas com o auxílio de um pauzinho com um ganchinho na ponta. Ainda sinto o sabor do biscoito assado quentinho, que mergulhava na massa crua.
A tarde, quando a última remessa de pêta saía do forno, era a vez de fazer o biscoito doce conhecido por ginête. Aí a meninada podia ajudar. As cadeiras espalhadas pelo quintal perto do forno, pequenos bolos de massa eram colocados nas formas caseiras, improvisadas em latas de sardinha, que depois de usadas, fazia-se ao centro um pequeno furo. A massa passava pelo buraquinho da forma, era cortada e recebia o formato de S ou de pauzinhos que preenchiam as bandejas para assar. Quando a vó não estava por perto, a molecada aproveitava e enchia as bochechas com pedaços da deliciosa massa crua. E quando ela percebia, nos repreendia alegando que esse era o motivo do ginete não render.
Depois do ginête, com o forno menos quente, era hora de assar os bolos de puba e de milho. Colocava uma pequena porção numa forminha, e assava anteriormente para ter a prova de que a massa estava no ponto certo.
Era o dia inteiro fazendo biscoito que eram guardados nas latas e servidos na época das lapinhas, nos festejos da cidade, quando chegavam as visitas, para as comadres e para os parentes de longe. Essas memórias são parte da minha infância e adolescência, acompanhadas de poesia e sabores que só quem viveu, sabe.
Por Analítica
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