Numa tarde de abril de 2019, bastante entusiasmada com o início das aulas de violão, fui até uma loja de instrumentos musicais em Barreiras, distante 27 km de São Desidério, onde moro, para comprar meu próprio violão. Assim poderia aperfeiçoar os estudos em casa, como sugerido pelo professor de música. Diante de uma infinidade de marcas e modelos não sabia qual instrumento escolher ao certo. Um vendedor veio ao meu encontro me explicar.
De
repente a imagem de uma pessoa que adentrava à loja, chamou minha atenção.
Nessa hora não mais ouvia o que o vendedor explicava, apesar dele continuar
falando. Minha atenção se voltou inteiramente para quem acabava de entra na
loja. Minha memória insistia em recordar de alguém que parecia já ter conhecido.
Outros vendedores gritaram um nome que parecia ser seu apelido e isso logo me
levou a crer que realmente se tratava de quem eu imaginava. Tentando disfarçar
e ao mesmo tempo olhando, a sua condição atual foi o que mais me impressionou.
Seu braço esquerdo mutilado e enfaixado pouco abaixo do ombro parecia ter sido
algum acontecimento recente. E eu continuava olhando para ele. Não para o
braço, mas para ele, tentando imaginar o que teria acontecido de fato. Seu
rosto estava triste e seu olhar aéreo. Percebendo que eu o olhava, adentrou à
loja, onde me encontrava, e também me encarou ao passar por mim. Perguntei se
lembrava de mim, pois havíamos estudado juntos há muito tempo atrás em São
Desidério. Rapidamente, ele balançou a cabeça confirmando e sorriu ponderado
indo se sentar aos fundos da loja onde esperavam outros vendedores amigos seus.
Fiquei estática. Tentei não continuar olhando, mas meus olhos insistiam em
olhar. Ainda por algumas vezes, sem querer, meus olhos correram em direção aos
fundos da loja, onde ele se encontrava sentado. Seu semblante era triste e o
olhar tão distante. Os vendedores tentavam puxar conversa e alegrá-lo.
Minutos
depois, já no caixa, concluindo a minha compra, não pude resisti. Não poderia
sair daquele lugar sem saber de fato o que teria acontecido ao meu ex-colega.
Perguntei reservadamente ao vendedor que me atendeu. Percebendo a minha
curiosidade ele disse que há alguns meses aquele jovem havia se envolvido em um
trágico acidente em outra cidade, o qual teve outros veículos envolvidos e
várias vítimas fatais, inclusive de uma mesma família. E por consequência, seu
braço esquerdo foi quase totalmente amputado. Surpreendi-me com a resposta,
pois me recordei naquele exato instante de qual acidente se tratava e da
repercussão dada pela mídia na época. Respirei. Olhei mais uma vez para ele. Na
hora de sair da loja, despedi ao longe mencionando seu nome. Ele olhou para mim
e acenou friamente. Fui embora e pelo resto do dia a sua imagem não saia de
minha cabeça. Naquela noite tive insônia e não parava de pensar nesse reencontro
com aquele ex-colega, e de seu olhar triste e tão distante.
Por Analítica
Foto: Divulgação
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