“Do jeito que Deus quer”. Assim Maria Salomé de Souza define sua
história de vida. Há 15 anos não sai de casa por conta de problemas de saúde. Vive da pensão deixada pelo marido em sua casa
modesta, à
rua Heliodório Xavier dos Santos, 156 no centro da cidade.
Da porta lateral que dá acesso à cozinha sai uma senhora de cabelos
brancos, pele alva, voz aguda e tronco curvado pela idade. Ela
caminha em direção a copa apoiada em uma bengala e senta em uma cadeira de repouso acolchoada. Uma roda de fiar fica ao seu lado esquerdo, onde descansa uma
caneca e alguns
remédios. Em cima da mesa, garrafa de café, xícaras, o Evangelho segundo o Espiritismo de Alan Kardeck e o velho rádio.
“Todos os que chegam aqui me contam o que acontece lá fora na
cidade. É por meio desse rádio que fico sabendo as notícias do Brasil e do mundo”, declarou. Maria Salomé tem uma rotina inalterada. Prioriza a mesma
sequência todos os dias: acordar cedo, tomar o café e ler o evangelho, assim como o
banho, em dias frios às 13 horas, e quando o tempo está mais
quente às 16 horas.
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Foto: Ana Lúcia Souza |
Nasceu em 23 de setembro de 1920 em Roçado Velho, localidade de São Desidério, onde viveu com a mãe Julia Pereira da Cruz e os cinco irmãos até os dez anos. O pai ela não
conheceu. Casou-se com Roberto Pereira dos Santos,
natural de Santa Maria da Vitória, conhecido de sua infância e não teve
filhos. À pé, saíram de São Desidério em 25 de julho de 1940 chegando ao Goiás no final de
setembro deste ano.
Trabalharam em muitos lugares e assim se passaram 28 anos, até regressarem a Bahia com outras três
famílias, chegando em São Desidério em 19 de setembro de 1969. “Era o dia de festa da
Padroeira Nossa Senhora Aparecida. Tinha muita
gente na rua. Graças a Deus até hoje eu estou aqui”, sentenciou.
Mas foi na feira livre que Maria Salomé se tornou popular. A feira era o principal meio de
sobrevivência, onde ela costumava vender café com bolo e posteriormente almoço. A
barraca de Maria Salomé tinha um diferencial. Com muita
criatividade ela mesma engrenou o planejamento de um fogão improvisado no meio da feira. A comida era feita na hora e vendida em prato feito. “Cozinhava bem sem saber”, gava-se. A
atividade rendia pouco dinheiro e durou até 1976. “Do quê vamos viver agora?” Perguntou o esposo. “Do jeito que Deus quiser”. Retrucou a esposa.
Engenhosa, Maria passou a
comercializar doce de leite caseiro e depois bananas, na feira e em casa. “A primeira sala e um quarto costumavam ficar cheios de cachos de
banana. Muitas pessoas vinham aqui em casa para comprar”, completou.
E assim
relembra ‘Maria, aquela que vende banana na feira’. Alegria é uma das marcas de sua personalidade. É na cadeira de
repouso, ao lado da velha roda fiar e do rádio, onde Maria Salomé, para quem não falta assunto nem ouvintes, passa a maior parte do
tempo, ‘do jeito que Deus quer’, pacientemente a
conversar com quem chega, e contar histórias, muitas histórias.
Por Ana Lúcia Souza
Texto publicado na 6ª Edição do Jornal de São Desidério