O texto abaixo foi publicado aqui em 2012, na ocasião do centenário do Sr. Corsino de Souza Almeida. Grande homem, personagem importante e um dos pioneiros da história do município de São Desidério, que tive a honra de entrevistar. Ele faleceu ontem, 27 de março, aos 105 anos.
Sentado à sombra de um frondoso pé de tamarindo, a imagem de um senhor de porte alto e elegante apesar da idade avançada, cabelos grisalhos, olhar distante, semblante sereno, retrata um dos momentos tantas vezes vivenciados por Corsino de Souza Almeida na Fazenda Coqueiro, a cerca de 05 km da sede de São Desidério. Nascido em 06 de janeiro de 1912, foi na fazenda que ele passou a maior parte do tempo ao longo da trajetória de 100 anos. A imagem se configura em uma ampla fotografia que hoje se encontra estampada na parede da sala de sua residência em Barreiras. Ao observá-la, é o próprio Corsino quem revela timidamente: "Ela, (a fazenda) me traz muitas lembranças boas".
Filho do Major Cesário de Souza Almeida e de Ana Rosa Alves das Neves, Corsino Almeida é o caçula de nove irmãos. Casou-se com Albertina Pimentel de Almeida (in memórian), com quem teve 18 filhos: Ana Rosa (Neta), João Luiz Carlos, Almiro (in memórian), Paulo César, Corsino Filho (in memórian), Maria Lúcia, Antonio Afrânio, Darilúcia, Maria (in memórian), Edila Maria, Vilma, Edina, Manoel Corsino (in memórian), Abigail Magna, Cesário Corsino, Lécio Roberto e Rosane. Os filhos fazem questão de lembrar as histórias do pai. "Meu avô Cesário nasceu no povoado de Olho D'Água. Por volta de 1901 ele casou e depois de morar em São Desidério comprou o terreno que hoje é a fazenda na localidade de Coqueiro, onde construiu a casa e teve seus filhos", relata o filho Luis Carlos.
Corsino passou a infância na fazenda Coqueiro e parte da adolescência em Barreiras com os padres Vieira e Carlos, que eram seus padrinhos. Foi nesse período que estudou no internato denominado Aprendizado Agrícola. Aos 17 anos o pai faleceu e Corsino retornou a fazenda para cuidar da mãe e dos negócios da família, exercendo a atividade de pecuarista. O cavalo era seu principal meio de transporte para se deslocar da fazenda para a então Vila São Desidério, via serra, acima do rio São Desidério, pois ainda não existia a atual estrada de acesso. Conta um dos filhos que a abertura dessa vicinal foi um mérito de Corsino. "Depois de muito embate com a Companhia Sertaneja, meu pai conseguiu essa estrada que hoje existe entre o rio e a serra", destaca Paulo César, que completa a narrativa. "Por entre pedras e morros, montado em seu cavalo branco, todo arrumado com terno de linho, meu pai balançava o coração das meninas pela região. Tinha muitas garotas que saiam de Angical e Barreiras querendo namorá-lo, porém, ele era muito tímido", frisou.
Major Cesário tinha uma afilhada muito querida chamada Albertina que costumava visitar a fazenda Coqueiro desde criança. Quando tinha 16 anos, Albertina foi surpreendida com o pedido de casamento de Corsino. Casaram-se, e na mesma casa construída pelo pai de Corsino, eles tiveram seus primeiros filhos. Uma professora que atendia pelo nome de Teotina foi contratada para lecionar na fazenda e ensinar as primeiras lições às crianças. Paulo César relembra a infância. "Lembro-me do tecido cáqui nº 1 e 2 usado por minha mãe para fazer nossos calções, calças e camisas. E as brincadeiras eram muito sadias. Havia muitas árvores na fazenda e a gente costumava fazer balanços com os cipós. Ou também tomar banho no rio São Desidério, onde nós aprendemos a nadar".
Em 1955 a família mudou para a Vila São Desidério e os filhos mais velhos continuaram os estudos. "Sempre aguardávamos com ansiedade os fins de semana para voltar à fazenda. Lembro do processo emancipatório de São Desidério em 1962, que inclusive meu pai votou a favor", disse Luis Carlos. Carinho, respeito e união são alguns dos valores que os filhos de seu Corsino expressam continuamente. "Não media esforço, sempre muito cuidadoso principalmente com nossa educação e saúde. Em casa todos tinham que sentar à mesa posta para fazer as refeições e nessas horas ele ensinava como se comportar. Muitos desses ensinamentos ele adquiriu na época que estudou no Aprendizado Agrícola", ressaltou César.
Na década de 1970, os filhos Ana Rosa e Almiro, já professores, implantaram o Curso de Ginásio Cenecista em São Desidério. Correspondente de 5ª a 8ª séries, o curso era relacionado a Campanha Nacional de Escolas da Comunidade (CNEC), e uma alternativa entre escola pública e particular. No município Almiro também foi responsável por inserir uma escola de datilografia com o apoio de sua esposa Eunina Pedrosa de Almeida, além de ser um grande incentivador do esporte, com destaque à prática do vôlei. Hoje, o ginásio de esportes municipal leva o seu nome.
Dois momentos que abalaram seu Corsino e família foram marcados pelo falecimento de Almiro, em 1993 - uma vez que os outros filhos faleceram ainda muito pequenos, e da esposa Albertina em 1996. "Acho que o fato de ter dois filhos deficientes que precisavam da sua atenção fez com que meu pai persistisse", revelou Carlos. Atualmente a família tem mais de 100 membros. Destes, 36 netos, 12 bisnetos. A fazenda Coqueiro é o ponto de encontro. A casa resguarda o aspecto antigo e conserva móveis tradicionais. Em ocasiões como em 02 de novembro se reúnem para uma missa celebrada na capela em honra a Bom Jesus Senhor dos Passos, construída pelo Major Cesário há mais de um século. Desde então a tradição é mantida. Nessa capela jazem os restos mortais de muitos ancestrais da família.
"O segredo para viver tanto ele não revelou. Tem uma alimentação balanceada, come moderadamente o que mais gosta. Dorme e acorda cedo. Desde a juventude gostava de jogar dama e gamão, e passou esses ensinamentos aos filhos. Gosta de estar sempre informado", afirma a primogênita Ana Rosa. Ainda segundo os familiares, até cerca de 98 anos ele ainda fazia trabalhos braçais. Nas comemorações do aniversário de 50 anos de São Desidério, em 2012, o patriarca da família Almeida recebeu uma condecoração pela longevidade e contribuição ao desenvolvimento da economia do município como agropecuarista.
Por Ana Lúcia Souza